A contratação de seguros em geral tem por finalidade a reposição de bens ou a indenização por prejuízo sofrido em decorrência de evento coberto pela apólice, gerando, portanto, estabilidade econômica ao segurado e/ou a sua família. No presente artigo, trataremos especialmente do seguro de acidentes pessoais com cobertura para invalidez.
A cobertura securitária para o evento da invalidez, constituída com a contratação do seguro e o pagamento regular do prêmio, objetiva com o recebimento de indenização de quantia certa, previamente acordada na apólice, a proteção financeira do segurado, bem como de sua família, nos casos que em razão de acidente coberto, o segurado vier a ficar impossibilitado de exercer suas atividades e desta forma comprometer seu orçamento familiar.
Neste sentido, tendo em vista o segurado estar vivo, caso haja discernimento, é dele o direito de pleitear junto à seguradora sua indenização, sendo este direito considerado de caráter personalíssimo.
No entanto, nos casos em que após a invalidez o segurado vier a falecer, embora, como citado anteriormente, a princípio o direito ao pleito da indenização ser considerado personalíssimo, constitui direito do espólio ingressar com o pedido por tal indenização, observado logicamente o período prescricional.
A legitimidade do espólio encontra guarida na previsão do artigo 943 do Código Civil (“O direito de exigir reparação e a obrigação de prestá-la transmitem-se com a herança”), uma vez que esta indenização securitária pela invalidez tem caráter patrimonial, passando, portanto, a integrar os bens deixados pelo “de cujus”, a serem partilhados entre os herdeiros.
A manutenção da atribuição de caráter personalíssimo à indenização por invalidez, mesmo após o falecimento do segurado, não parece razoável, seria contribuir para o enriquecimento sem causa da seguradora, tendo em vista que durante parte do período da vida do segurado ocorreu o desembolso de quantia para o pagamento do prêmio, visando a obtenção da indenização após a ocorrência de possível sinistro.
Cabível salientar que tal direito ao pedido da indenização pelo espólio permanece mesmo caso não tenha ocorrido pedido anterior realizado pelo próprio segurado, administrativamente, junto à seguradora, pois, exigir este pré-requisito seria desproporcional para aniquilar o direito ao recebimento da quantia pelos herdeiros.
Diversos são os julgados a respeito deste tema, nos quais do lado do segurador há a alegação do direito personalíssimo e de outro, por parte dos herdeiros do segurado, há a argumentação no sentido do caráter econômico da indenização securitária, porém, há precedente do STJ – Superior Tribunal de Justiça, no sentido de reconhecer a legitimidade do espólio para o pleito, rechaçando também os herdeiros que ingressam com pedido em nome próprio.
Importante acrescentar que a referida indenização por invalidez difere da indenização pelo evento morte, uma vez que esta, conforme previsão do artigo 794 do Código Civil, não constitui herança e não está sujeita às dívidas do segurado falecido, tendo em vista que o capital segurado é destinado aos beneficiários declarados na apólice, que não necessariamente são os herdeiros legais do segurado. Já no caso da invalidez, a indenização securitária integra o patrimônio hereditário, uma vez que esta quantia seria destinada diretamente ao segurado. Desta forma, o mencionado crédito está sujeito às dívidas do falecido, à partilha.
Diante do exposto, podemos concluir pela necessidade da relativização do direito personalíssimo atribuído às indenizações destinadas ao próprio segurado, em casos em que há o falecimento deste, trazendo, portanto, razoabilidade diante da contratação do seguro, do objetivo do segurado no momento da contratação e ao longo da relação contratual, do pagamento do prêmio, bem como na prevenção do enriquecimento sem causa do segurador no caso de entendimento diverso.
LAÍS DOS SANTOS ROMANO
MEMBRO DA COMISSÃO DE PROCESSO CIVIL – OAB/SANTO ANDRÉ – SP